Impacto da pandemia na alfabetização: Pais e responsáveis acreditam que 51% das crianças não se desenvolveram durante o ensino remoto.

Por: Jordânia Carvalho

Com o fechamento das escolas em caráter emergencial devido a pandemia da Covid-19, as aulas remotas entraram em cena e se estabeleceram na rotina de alunos, pais e professores. Com o agravante da restrição ao acesso da tecnologia que ainda é realidade de muitas famílias, os prejuízos foram ainda maiores e que podem resultar em uma geração semianalfabeta ou com atrasos na aprendizagem.

Quase 90% dos estudantes matriculados no 1º, 2º e 3º anos do Ensino Fundamental estão em processo de alfabetização. Mais da metade dessas crianças, 51% ficaram estagnadas no mesmo estágio de aprendizado durante o ensino remoto, 29% não aprendeu nada de novo e 22% desaprendeu parte do que já sabia, de acordo com a percepção dos pais e responsáveis. Os dados são da pesquisa realizada pela fundação Lemann, Itaú Social e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), divulgada em junho deste ano.

Fonte: Datafolha/Fundação Lemann, Itaú Social, BID.

A alfabetização faz parte de um marco importante na vida do ser humano. O processo é iniciado no 1º ano do ensino fundamental, as crianças passam a perceber um novo sentido em letras e números, reconhecer de palavras e frases, juntamente com a leitura e a escrita. Quando as crianças passam a compreender os sons e observar as palavras, pode-se afirmar que estão rumo à alfabetização. No ambiente escolar, os alunos são submetidos a uma alfabetização sistematizada, com abordagens específicas para sua idade, pois é um processo individual que irá se desenvolver através de estímulos que trabalharão o lado lúdico, sensorial e a criatividade.

A pedagoga especialista em coordenação e supervisão pedagógica, Ana Gladys, aponta que “com a pandemia tudo parou e a gente precisou do apoio da família e sabemos que a dificuldade da família é justamente essa, muitas mães, pais ou os responsáveis pelos nossos alunos de primeiro ano, que é a nossa etapa que a gente trabalha a alfabetização na escola não tem esse preparo.”

Foto reprodução: Brasil 61

As escolas e seus professores têm passado por uma adaptação e intenso planejamento para a elaboração e execução das aulas, pois o uso da tecnologia ainda era algo incomum para parte dos docentes. A ferramenta que era utilizada como um suporte ao que era ensinado em sala, passou a ser o método mais eficaz diante do contexto de pandemia.

DESAFIOS DA ALFABETIZAÇÃO REMOTA

Foto reprodução: Pixabay

A pandemia acertou em cheio a educação ao impor novas rotinas, acabou dividindo os indivíduos que têm acesso à tecnologia e os que nunca se quer tiveram um aparelho de celular conectado à internet. Com o “novo normal”, muitas escolas se viram obrigadas a traçar planos de estudos que contemplassem todos os seus alunos, além da especialização dos profissionais que buscaram se reinventar para extrair o melhor dos discentes. Vale lembrar que além das crianças os pais também tiveram que ser inclusos nos planos, pois como auxiliares devem ter pelo menos uma noção da didática dos professores para orientar os filhos.

A pedagoga Ana Gladys aponta que “Nós temos professores da rede que já fizeram várias formações para trabalhar as questões de alfabetização em sala de aula, nós temos um currículo todo estruturado. Tínhamos um trabalho bem organizado, pensado exclusivamente na alfabetização das crianças a rede municipal. Muitos deles (pais e responsáveis) são semialfabetizados e a nossa dificuldade maior é essa, né!? Como contar com a ajuda de uma pessoa para trabalhar questões de alfabetização, sem a gente ter uma pessoa que não saiba nem ler direito?”

Os apontamentos feitos pela pedagoga, foram pautas em reuniões de docentes, para que soluções fossem encontradas e o ensino optimizado. Uma das estratégias adotadas foram as formações de grupos em WhatsApp para que os pais pudessem ter um contato direto com professores, onde foram repassadas orientações tanto para o uso de aplicativos como na abordagem da criança na hora da realização das atividades, além de servir como um espaço em que os pais poderiam sanar dúvidas.

A participação dos pais e ou responsáveis tornou-se fundamental, a mãe de uma criança de seis anos, que faz parte da rede pública de Teresina-PI, relata que o processo de alfabetização iniciado no ano de 2020 “foi uma das experiências mais difíceis, eu nunca imaginei que seria tão complicado alfabetizar alguém, acho que a orientação que a escola deu me ajudou bastante. Apesar das dificuldades de conciliar meu trabalho com a educação dele(a) acredito que consegui pelo menos em parte alfabetizar minha criança”.

A RETOMADA DAS AULAS PRESENCIAIS

Foto reprodução: Getty Imagens

O retorno das atividades escolares em todo o país teve início com o modelo híbrido, o qual mescla o ensino presencial e o on-line ao mesmo tempo e retorno as salas de aula de forma escalonada. Quando foram levantadas hipóteses da retomada das aulas, as escolas já pensavam em quais estratégias seriam adotadas, pois toda essa experiência vivida nesse período pandêmico, podem ter ocasionado diversos impactos negativos, não apenas na aprendizagem, mas no desenvolvimento socioemocional. É necessário lembrar que agora com o retorno ao ambiente escolar as crianças terão que passar por uma nova mudança de rotina, que consequentemente terá seus impactos refletidos na educação.

Apesar dos recursos apresentados para minimizar os impactos da pandemia na alfabetização, questionamentos levantados pela pedagoga Ana Gladys chamam atenção.” Até onde essas aulas (remotas) conseguiram atingir os nossos alunos? Até onde nossos alunos conseguiram entender esse sistema e se apropriar do que estava sendo oferecido a eles?”.

A pedagoga aponta que só vai poder de fato constatar esse nível de aprendizado com o retorno total das aulas, através de testes que serão feitos individualmente em cada aluno para avaliar, qual o real cenário. “Pois a alfabetização não é uma coisa simples, não é só fazer o aluno ler e escrever, vai muito além disso.” Afirma Ana Gladys.

Apesar do Plano Nacional de Educação (PNE), Lei 13.005/2014, que estabelece o que deve ser feito para melhorar a educação do país até 2024, desde o ensino infantil até a pós graduação, estima que o Brasil deve zerar a taxa de analfabetismo até 2024. Mas as metas do PNE, não contavam com a pandemia, o que torna essas metas um pouco ilusórias.

A pedagoga estima que o impacto desse prejuízo na alfabetização possa durar de dois a três anos ou até mais, para que a rede seja colocada nos parâmetros de alfabetização que tinham anteriormente, com bons resultados. E reforça que terão muito trabalho para que se consiga elevar o nível desses alunos.

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